Uma Caminhada pela Arrábida
Desta vez calhou ao Ventor comer as sardinhas de Santo António, pelos sopés da serra da Arrábida.
Mas não foi só pelo Santo António. Foi pelos seus amigos, pelas flores, pelos sobreiros, pelos caminhos de terra batida, pelo sol, pelos fetos, ... Sim, pelos fetos! Fetos? Bem, para mim, também os conheço mas, para o Ventor, os fetos são seus companheiros desde o berço. Ele, já me disse que sabe que os fetos podem ser um estorvo em determinadas circunstâncias mas, tudo tem o seu valor, até os fetos!
Os fetos deverão existir por muitas latitudes, diz ele. Diz que, no Brasil, os tupis (indígenas brasileiros) chamam-lhe simambaias e, isso, significa que também há fetos no Brasil. Ele também já me disse que começou a observar os fetos nas suas Montanhas Lindas, lá pela Açoreira.
Contava-lhe a sua mãe que, com poucos meses de vida, dormia à sombra de fetos, junto ao muro do Curral enquanto seu avô enchia os cestos do esterco das vacas que as mulheres transportavam para as lavouras e, uma cobra, saída dos buracos do muro, cheia de inveja, com o cheirinho a leite, foi deitar-se ao lado do Ventor, entre os fatelos. Como o Ventor não gostava daquela coisa fria e escamuda, junto de si, desatou num berreiro e seu avô foi ver o que se passava.
Seu avô pegou na cobra e espetou-lhe com a cabeça contra o muro, matando-a. Seria a primeira vez que o Ventor terá tido responsabilidade indirecta por uma morte. Se calhar, terá sido por isso que o Ventor, até aos seus 15 anos, foi o terror das cobras, dos lagartos e de todos os animais rastejantes e não só. Como o Ventor ainda choramingava, seu avô tirou um grupinho dessas flores de entre os fetos e começou a brincar com o Ventor, fazendo-o rir.
Mas, voltando às fraldas da Arrábida, os fetos ofereceram ao Ventor as suas flores lindas de criança - as flores de S. João. Foi assim que a sua mãe o ensinou a chamar-lhe. Isso porque, segundo ele julga, elas apareciam sempre por alturas do S. João. Daí o nome de flores de S. João. Mas hoje, eu dei uma ajuda ao Ventor e, os dois, descobrimos o nome botânico das suas lindas florezinhas azuis - Jasion Montan, L., e que há pessoas que lhes chamam "botão azul".
Saídas de entre os fetos elas saúdam o Ventor
No dia de Santo António, deste ano, 13 de Junho, o Ventor fez a terceira grande festa às "Jasion Montan" - os botõezinhos azuis. Quando o Ventor saiu da sua terra, nunca mais viu os tais botõezinhos azuis que ele apanhava para dar à sua mãe. Como caminhava sobre alcatifas, era natural que não houvesse, pelos seus trilhos, "jasion montan". Apareciam flores sim, mas em jarras! Flores lindas dos jardins e das explorações comerciais que nada tinham a ver com as flores silvestres que ele conhecia. Um dia, na serra de Monchique, no Algarve, descobriu as suas florezinhas de S. João.
Quando ia de visita à sua terra, já as flores tinham desaparecido. Um dia, caminhando pelos Picos da Europa, deparou-se com as suas flores lindas e o Ventor esqueceu tudo. Dedicou-se às suas flores lindas. Agora todos os anos que vai a Adrão, tem sempre a visita das suas flores preferidas.
Pela Galiza, por todo o Minho, Adrão, Peneda, Castro Laboreiro, Soajo, por todos os caminhos, basta olhar os socalcos como há 50 anos atrás e lá estão os botõezinhos azuis, gritando alto: "olá, Ventor"!
Foi assim este dia de Santo António. Do meio dos fetos, todos em uníssono, gritaram "olá, Ventor"! Foi uma surpresa que o Santo António quis fazer ao Ventor! Santo António sentia ciúmes da amizade do Ventor pelo S. João e sabia que as florezinhas azuis tinham a ver com isso. Este ano antecipou-se e pediu às "jasion montan" para saltarem do meio dos fetos e saudarem o Ventor. Assim, o Ventor, as "jasion montan" e o Santo António festejam juntos, sob a luz e o sorriso do seu amigo Apolo as fores azuis que também mostram as suas belezas entre os fetos e os sobreiros dos sopés da serra da Arrábida.